Diversos

Expectativa

 

Ele a esperava no ponto de ônibus, chovia muito. Céu cinza, vento gelado, mãos dentro da jaqueta. Esperou. Esperou… Olhou o relógio, 16:45. Era só uma questão de tempo, já havia esperado tanto antes. Mas esses minutos breves eram eternos dentro dele.

Sentiu uma gota gelada sobre os cabelos. Já estava ficando impaciente, queria tanto vê-la. Quando chegasse, o que iria dizer? Oi, e aí, como cê tá? Não.. iria abraçá-la primeiro. Não, não! Iria dar um beijo na testa, demonstrar ternura… e aí tentaria dar as mãos… mas, e se ela não quisesse?  Hum… verdade, talvez fosse cedo demais, melhor ficar só no cumprimento tradicional e desapegado.

Sentiu seu corpo tremer. Talvez fosse melhor ir embora… não era coisa pra ele, não senhor. Ficou tanto tempo distante, talvez o reencontro de nada adiantaria. Provavelmente ela o odiava. Além disso, ele não queria se apegar. Ficou tanto tempo longe, sentiu saudades…  Olhou a fotografia dela na carteira, beijou a foto. Chega logo! Tanto tempo..

Por que fugi todo esse tempo? Foi rebeldia sim, desnecessária. Mentira! Fugi porque precisava. Precisava do meu tempo, do meu canto, das minhas experiências. Sempre gostei de colo, carinho, claro que queria que estivesse comigo, seria mais fácil… mas não seria completo. Eu não estaria completo. Mas se rebelar assim… ter feito sofrer quem me amava e quem eu amo, não é certo também.. não sei..

Olhou o relógio novamente, 17:05. Nada… Será que ela precisa de mim? Não, ela sabe se cuidar sozinha! Me ensinou tudo o que sei. É tão corajosa. Como será que deve estar seu corpo? Da última vez que a tinha visto os braços estavam finos, cabelo muito negro e a pele morena, linda. Lembrava da voz, das canções. O cafuné, o colo, as conversas.

A chuva parava. O céu continuava cinza. Vários carros passavam na via. Já pensava em desistir.
Olhou o próprio reflexo numa poça de água no asfalto. Tinha mudado muito por dentro, mas não muito por fora. Talvez um pouco menos de cabelo e a barba por fazer fossem as únicas diferenças notáveis.

Nesse instante pára um ônibus, várias pessoas começam a descer. Um casal de homens, um senhor e sua esposa, amigas, trabalhadores.. e ela! Ela! Caramba… continua linda! Coração a mil, queria pedir desculpas, queria abraçar, mas não sabia como!
Abobalhado, chegou perto com um certo receio, temendo alguma repreensão, palavras feias, desafeto.

Com a boca entreaberta, suspirou. Estendeu a mão para ajudar com as malas.
O silêncio era insuportável. O silêncio de estar cara a cara e ninguém dizer nada. Ele tinha que dar o primeiro passo, por que foi ele que resolveu sair de casa, foi ele que bateu a porta por último, foi ele.

– E aí… como você tá, mãe?

Aproximou-se e beijou a testa dela, com muita ternura.

Obs: Esse texto foi escrito por mim e publicado pela primeira vez em 26 de fevereiro de 2012, em outro blog (o “warum nicht?”, atualmente desativado). É curioso ler ele depois de seis anos, lembrar de quando como ele foi feito, e perceber que ele ainda me desperta as mesmas sensações de antes. Tão antigo, e ainda tão atual.